Quando falamos em inovação, nossa mente automaticamente nos leva para startups e iniciativa privada como um todo. Entretanto, novas tecnologias e modernização (devem) e existem também no setor público. Afinal, como pensar em desenvolvimento sustentável, pautado em disrupção, se soluções inovadoras orbitarem apenas em empresas?
É fato que a pandemia trouxe uma maior aceleração desse processo, uma vez que entidades e órgãos públicos se depararam com desafios inimagináveis até março de 2020. Novas ferramentas, conscientização e o avanço de investimentos incentivaram a expansão da inovação nessas esferas, contribuindo positivamente para a sociedade como um todo.
No Brasil, existe uma série de programas de inovação criados por governos e instituições públicas, ainda que sejam pouco divulgados no mercado. Antes de nos aprofundarmos nessas iniciativas, ressalto que inovar não é ter ideias mirabolantes com a promessa de salvar o mundo ou solucionar todos os problemas de uma comunidade. Ela é resultado de uma construção de mentalidade, aliando os setores público e privado para resolver questões e transformar cenários.
Inovação pode ser aplicada em diferentes contextos, como administrativos, técnicos, organizacionais, serviços, produtos, etc. Se fomentar a disrupção em uma empresa privada já é um desafio, transferir essa mudança para governos e organizações ganha nuances ainda mais complexas. Assim como em uma marca, todos os envolvidos precisam incorporar a cultura proposta.
Uma grande questão que permeia a inovação pública é altamente mercadológica. Empresas privadas dançam conforme a música da indústria, da concorrência e das necessidades do cliente. Entretanto, na esfera pública, quais seriam as principais motivações para inovar? Uma vez que optar pela modernização pode afetar intimamente os processos e resultados que estamos acostumados a lidar.
Novas abordagens, adoção de ferramentas e inserção de tecnologias aqui devem estar pautadas em melhorar a qualidade de vida da população, bem como desenvolver políticas públicas que atendam aos interesses da sociedade de forma mais ágil, assertiva e menos burocrática.
Dentre os programas de inovação do setor público brasileiro, podemos destacar:
Plano Nacional de Internet das Coisas: o conceito de Internet das Coisas pode ser entendido como a conexão de objetos cotidianos à rede de internet, constituindo uma rede de objetos capazes de transmitir dados. Baseado nesse conceito foi elaborado o Plano Nacional de Internet das Coisas, cujo principal objetivo é monitorar e organizar formas de incentivar o desenvolvimento da tecnologia.
Sinapse da Inovação (SC): se trata de um programa de incentivo criado em Santa Catarina. Por meio do investimento em startups, a iniciativa visa desenvolver a tecnologia do estado de Santa Catarina e aprimorar os seus serviços públicos.
GNova: laboratório de inovação do governo federal brasileiro, o GNova é fruto de uma parceria com o governo da Dinamarca e se propõe a desenvolver soluções inovadoras em projetos com instituições do governo federal para que o serviço público possa responder com mais eficiência às demandas dos cidadãos.
No exterior, alguns cases interessantes são:
GovLab (EUA): fundado em Nova York, em 2012, o GovLab é um centro de pesquisas cujo principal objetivo é fazer com que os governos repensem suas formas de atuação.
Corfo (Chile): O site criado pelo governo chileno divulga editais e projetos de empreendedorismo inovadores do país. É possível selecionar os projetos mais próximos de você utilizando a sua localização, além de filtrá-los por beneficiário (intermediário, empresa, pessoa física, pessoa jurídica ou instituição). O objetivo do portal é aumentar a produtividade inovadora e a diversidade dos projetos que contribuem para o fortalecimento do capital humano e o desenvolvimento tecnológico sustentável.
Public Sector Innovation (Austrália): o site do projeto disponibiliza um conjunto de ferramentas que podem ser utilizadas por vários agentes de todo o país. Os interessados podem aprender mais sobre o processo de inovação, diagnósticos e como colocar as ideias em prática. O programa também promove eventos para disseminar a importância do tema no setor público e coordena uma rede de agentes públicos
Futurs Publics (França): a organização criada pelo governo francês atua tornando os serviços públicos mais simples e acessíveis para a população.
Mind Lab (Dinamarca): o programa desenvolvido pelo governo dinamarquês reúne empresários e cidadãos na criação de soluções inovadoras que contribuam positivamente com a sociedade.
Também podemos destacar a Estônia, uma das nações mais digitais do mundo. O país até desenvolveu um Manual de Introdução ao Governo Digital, uma espécie de glossário de aprendizagem, entendimento e familiarização com termos e práticas no ambiente digital.
No país, os serviços prestados pelo governo são integrados em uma única plataforma, a X-Road, com autenticação feita pelo uso de RG com chip. Dos 1,3 milhão de estonianos, cerca de 98% possuem RG digital e garante o acesso aos serviços, sendo três deles obrigatórios o porte do documento: casamento, divórcio e transferência de imóvel.
O KFW, grupo bancário alemão, é comprometido com a melhoria sustentável das condições de vida da população nos âmbitos econômico, social e ambiental. Fundado em 1948, o banco hoje pertence ao governo, porém é ativo no país e internacionalmente. As atividades de financiamento internacionais abrangem a área de financiamento à exportação e project finance, que é da responsabilidade de subsidiária KfW IPEX-Bank, a área de negócios KfW Entwicklungsbank (KfW Banco de Desenvolvimento), e a DEG (Sociedade Alemã para Investimentos e Desenvolvimento, na sigla em alemão).
O israelense Kayma Labs, liderado pelo professor Dan Ariely, pesquisador em Psicologia e Economia Comportamental. A iniciativa utiliza ferramentas digitais ao lado de equipes de pesquisa, tecnologia, UX e design para setores como educação, saúde, finanças e infraestrutura.
E a lista é longa. Também não posso deixar de citar alguns labs desenvolvidos que levam inovação para engrenagens governamentais que impulsionam a modernização dos elos da cadeia produtiva do país.
O LIFT (Laboratório de Inovações Financeiras) é uma iniciativa fruto da parceria entre o Banco Central e Fenasbac. O programa foi pensado para levar inovação ao Sistema Financeiro Nacional, por meio de protótipos de soluções tecnológicas. Criado em 2018, o laboratório expandiu suas frentes de atuação e hoje possui três ramificações:
LIFT Lab: com foco em empresas ou pessoas que colaboram com ideias inovadoras para o mercado, mas que precisam de investimentos para ganhar escala, relevância ou sair do papel.
LIFT Learning: se trata de parcerias com universidades, instituições educacionais e centros de pesquisa com o intuito de despertar o interesse pelo empreendedorismo em jovens e estudantes.
LIFT Challenge: edição especial do LIFT que reúne empreendedores interessados em desenvolver MVPs de acordo com o foco de cada desafio proposto, visando impactar positivamente o Sistema Financeiro Nacional.
O CoLAB-i é o Laboratório de Inovação e Coparticipação do TCU (Tribunal de Contas da União), criado para propagar a inovação na administração pública em prol da sociedade. Com trabalhos coordenados, a iniciativa investe em projetos de open innovation que agregam conhecimentos replicáveis.
O programa conta com uma gama de parcerias e conteúdos que buscam levar a inovação para a esfera pública. Uma delas é a Jornada do Contrato Público para Solução Inovadora ou CPSI. Uma modalidade de compra pública de inovação, dividida em uma Trilha de Planejamento e uma Trilha de Instrumento, com o objetivo de desenvolver novas soluções.
O laboratório do TCU também firmou parceria com o BID (Banco Interamericano de Desenvolvimento) para apoiar a contratação de inovação na administração pública. O CoLAB-i ainda compartilha práticas de Design Thinking e conteúdos de fomentação de novas tecnologias na iniciativa pública, entre outras ações.
Buscando fortalecer a conexão entre pequenos negócios e empreendedores com o universo da inovação financeira, o Sebrae-SP está desenvolvendo o Delta Fintech Lab — hub construído com parceiros para apoiar fintechs na criação de soluções financeiras. O projeto contará com um programa de auxílio a startups que buscam investimento, o Delta Capital, que terá participação da Ventuir Aceleradora e apoio do CVM (Comissão de Valores Mobiliários), BID e Sebrae Nacional.
Até o fim de 2022, o Sebrae pretende impulsionar mais de 500 startups com faturamento limite de R$ 4,8 milhões, com o aporte de R$ 200 milhões a serem investidos em quatro anos. As empresas escolhidas serão acompanhadas pela entidade em programas estruturados.
Em 2017, nasceu o Laboratório de Inovação Financeira, desenvolvido pelo BID, CVM e ABDE (Associação Brasileira de Desenvolvimento) e a instituição alemã GIZ. Com a participação de representantes das iniciativas pública e privada, o LAB tem como objetivo catalisar a inovação em finanças sustentáveis no Brasil, direcionados a títulos verdes, blended finance, crowdfunding de investimento, mercado de carbono, bioeconomia, tokenização de ativos, taxonomia entre outras frentes de atuação.
Este ano, o LAB foi eleito um dos melhores laboratório de inovação do mundo pela Global Finance Magazine, que há cinco anos lista players e tendências do mercado de fintechs. A iniciativa visa criar soluções disruptivas de financiamento com o intuito de viabilizar projetos de caráter socioambiental. Dentro desse ecossistema, atuam entidades governamentais como Banco Central, CVM, Previp, entre outros, além de participações da iniciativa privada.
Não faz muito tempo que o setor público passou a voltar sua atenção para o mercado de inovação, mas os cases citados acima apontam o imenso potencial que essa junção tem para impactar positivamente a sociedade. A criação de soluções benéficas surtem efeito em todas as pontas, surtindo em uma verdadeira reação em cadeia. E ainda há muito o que vir pela frente.
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